Capítulo 20 | Novel 'Benção do Oficial do Céu'

outubro 09, 2021 0

 


CAPÍTULO 20 - Distância Encurtada; À Deriva nas Tempestades de Areia

Benção do Oficial do Céu



 

 


“Mesmo que você tenha apenas lido registros inconsistentes e rumores, o Reino de Meia Lua certamente existe,” Xie Lian se pronunciou.

“Ah, é?” San Lang murmurou.

Naquele momento, Nan Feng acabou de desenhar a formação mágica no chão e avisou os outros no local, “Está pronto. Quando devemos ir?”.

Xie Lian rapidamente empacotou algumas coisas em uma trouxa e parou diante do encantamento. “Agora mesmo.”

Ele pousou sua mão na formação e recitou, “Que a benção dos céus abra todos os caminhos!” Então, gentilmente empurrou a porta criada.

Quando o portal foi aberto, o que podia ser visto não era mais o pequeno morro no vilarejo lá fora, e sim uma larga avenida em uma cidade.

Contudo, mesmo que as ruas fossem extensas, não havia quase ninguém andando por elas, apenas um ou dois transeuntes aqui e ali. Aquilo não era por causa do fato de já estar escuro, mas porque a população no extremo Noroeste era relativamente pequena, além de estar bem próxima ao Deserto de Gobi. Até em plena luz do dia não haveria muitas pessoas andando por aí. Xie Lian fechou a porta atrás de si e viu que não era mais o interior do Santuário Puqi do outro lado, e sim uma pequena pousada. Aquele único passo havia certamente cruzado milhares de quilômetros, as maravilhas do feitiço de Encurtamento de Distância.

Alguns pedestres passaram por perto, olhando-os de cima a baixo e cochichando entre si, parecendo bastante alarmados.

San Lang disse atrás do príncipe, “De acordo com os registros históricos, quando a lua desaparecer do céu, siga a estrela do norte e você encontrará o Reino de Meia Lua. Gege, veja.” O rapaz apontou para o céu, “Ali está Polaris.”

Xie Lian olhou para cima e sorriu. “É tão brilhante.”

San Lang deu um passo para mais perto do deus e mirou-o brevemente, voltando seus olhos para cima novamente, “Sim. Parece que o céu no Noroeste é de alguma forma mais vasto que nas Terras Centrais.”

Xie Lian concordou e os dois ficaram presos em uma discussão sobre estrelas e o céu noturno por algum tempo. Enquanto isso, os dois oficiais juniores atrás deles assistiam a tudo desacreditados.

Nan Feng questionou, “Por que ele está aqui também?”.

“O portal que você criou era tão mágico que acabei os seguindo para dar uma olhada,” o jovem respondeu inocentemente.

“‘Dar uma olhada’?! VOCÊ ACHA QUE ISSO É UM PASSEIO?!” Nan Feng rugiu furioso.

Xie Lian massageou sua testa e disse, “Deixe para lá. Já que ele está aqui, está aqui. Ele não vai comer suas rações, eu devo ter comida para nós dois. San Lang, fique perto de mim, não se perca.”

“Tudo bem,” San Lang afirmou, parecendo bom e obediente.

“ISSO NÃO É UMA QUESTÃO DE RAÇÕES!”

O príncipe suspirou. “Nan Feng, por favor, fale mais baixo. Estamos no meio da noite, todos já foram dormir. Vamos apenas nos focar em nosso objetivo e parar de nos importarmos com pequenas discussões. Ande, ande.”

“...”

Os quatro seguiram a estrela do norte e viajaram em direção ao deserto. Depois de andarem sem parar por uma noite inteira, as cidades e vegetações ficaram cada vez mais esparsas e o solo lentamente se transformou em areia. Finalmente, eles haviam chegado ao Deserto de Gobi. Apesar do feitiço de Encurtamento de Distância ajudar a cruzar incontáveis quilômetros em um único passo, o encantamento exigia uma quantidade de poder espiritual deveras exaustiva. O portal que cruzaram desenhado por Nan Feng o faria levar no mínimo várias horas para se recuperar totalmente. Para conservar força no caso de que acabassem por entrar em combate, Xie Lian não deixou que Fu Yao fizesse a mesma coisa. Para uma jornada como aquela, alguém precisava manter seus poderes intactos.

No clima desértico, a diferença entre o dia e a noite era extrema. As noites congelavam até os ossos, mas eles podiam aguentar. Quando o dia raiava, no entanto, era outra história. O céu estava limpo e sem nuvens, dando espaço para o sol escaldante. Era como se estivessem andando em cima de um fogão aceso, sendo cozidos lentamente enquanto caminhavam.

Xie Lian liderava o grupo, usando a direção do vento e a parca vegetação crescendo embaixo das rochas para encontrar seu caminho. Depois de um tempo, ele olhou para trás, preocupado que algum deles não fosse mais capaz de continuar. Nan Feng e Fu Yao eram imortais e estavam obviamente bem. Olhar para San Lang, contudo, fez o deus rir.

Embaixo do sol ardente, o jovem havia tirado sua túnica vermelha e a usava para bloquear os raios de luz, parecendo cansado e rabugento. Sua pele era branca como uma pérola, seu cabelo preto como carvão e, com o casaco cobrindo seu rosto, suas feições pareciam ainda mais acentuadas.

Xie Lian tirou seu chapéu de bambu da cabeça e o colocou sobre a de San Lang. “Aqui, vou emprestá-lo a você.”

Surpreso, o rapaz soltou uma risada e disse, “Está tudo bem,” devolvendo o chapéu ao outro. Xie Lian não argumentou, se o garoto dizia que não precisava, então não havia necessidade de pressioná-lo.

“Avise-me se precisar, então.” O príncipe ajeitou o objeto em sua cabeça e continuou a caminhar.

Depois de um tempo, o grupo notou uma pequena construção acinzentada no meio de toda aquela areia. Analisando mais de perto, o prédio aparentava ser uma pousada abandonada. Xie Lian olhou para o céu, constatando que deveria ser pouco mais de meio dia, quando o calor ficava mais intenso. Eles haviam andado a noite inteira, estava na hora de uma pausa. O deus os liderou para dentro, encontrando uma mesa para se sentarem e descansarem.

De sua trouxa, Xie Lian tirou uma garrafa d’água e a entregou para San Lang. “Quer um pouco?”.

San Lang assentiu, levantando a mão para pegá-la e beber antes que Xie Lian a tomasse de volta e desse um gole também. Ele engolia o líquido com gosto, seu pomo de Adão se movendo para cima e para baixo, sentindo-se incrivelmente refrescado e energizado. Ao seu lado, San Lang apoiava o queixo em uma das mãos, roubando olhares de Xie Lian enquanto este saciava sua sede.

Um momento depois, ele perguntou, “Ainda tem água?”.

O príncipe secou as gotículas acumuladas em seus lábios umedecidos e assentiu, passando-lhe de volta a garrafa. O rapaz estava prestes a pegá-la quando outra mão o impediu de tomá-la de Xie Lian.

“Espere,” Fu Yao disse.

Ele pegou sua própria garrafa d’água de sua sacola e a colocou sobre a mesa, empurrando-a em direção a San Lang. “Eu tenho uma também.”

Xie Lian imediatamente soube o que o júnior estava planejando.

Conhecendo a personalidade de Fu Yao, era impossível que este dividisse sua própria água de bom grado. Nan Feng e ele estavam falando sobre como testar San Lang na noite anterior, então o líquido na garrafa devia ser Água Reveladora. 

Se um humano comum bebesse uma poção como esta, nada aconteceria. Porém, se o indivíduo fosse qualquer outra coisa, a Água Reveladora o forçaria a mostrar sua real identidade. Já que Nan Feng e Fu Yao queriam testar se aquele jovem era um Supremo, então os efeitos daquela poção deveriam ser consideravelmente fortes.

San Lang sorriu, “Gege e eu podemos dividir uma garrafa, está tudo bem.”

Os dois oficiais juniores olharam para Xie Lian de soslaio e o deus pensou, “Por que estão me olhando desse jeito?”.

Fu Yao disse friamente, “A garrafa dele está quase vazia, não precisa ser tão educado.”

“Sério? Então, vocês dois podem beber primeiro, não precisam se preocupar comigo,” San Lang recusou. 

“...”

Os oficiais ficarem em silêncio. Um instante depois, Fu Yao tentou novamente, “Você é um convidado, pode beber primeiro.”

Seu tom era educado e ele tinha boas maneiras, mas Xie Lian só conseguia pensar que o júnior devia ter praticamente cuspido tais palavras entredentes. San Lang também fez um gesto de agradecimento.

“Vocês dois são os seguidores do anfitrião, por favor, bebam primeiro, seria descortês de minha parte fazê-lo.”

Xie Lian continuou assistindo os três brincarem daquele jogo bobo de falsas gentilezas e acabou por sentir um pouco de pena da pobre garrafa d’água sendo bruscamente empurrada de um lado para o outro. Ele sacudiu a cabeça, a mesa tremia por causa de sua força anormal e o deus temia que ela não durasse muito tempo. 

Finalmente, Fu Yao não aguentou e zombou, “Você não aceitar esta água significa que tem algum peso na consciência!”.

San Lang respondeu com um sorriso, “Você está sendo hostil e se recusou a beber primeiro. Quem sabe se a água não está envenenada? Talvez vocês sejam aqueles com peso na consciência.”

Fu Yao apontou para Xie Lian. “Você pode muito bem perguntar a ele se a água está envenenada!”.

“Esta água está envenenada, gege?” San Lang questionou o príncipe.

Era uma pergunta de fato ardilosa. Tecnicamente, a Água Reveladora era uma poção que expunha a verdadeira forma de alguém e não machucava pessoas reais.

Xie Lian respondeu cautelosamente, “Não está envenenada, mas…”

Fu Yao e Nan Feng focaram seus olhares de volta em San Lang e ele, surpreendentemente, parou de empurrar a garrafa.

“Tudo bem.” San Lang pegou o objeto e o agitou divertidamente em sua mão. “Se gege diz que não tem perigo, então não há problemas.”

Ele engoliu o conteúdo da garrafa em um único gole. Xie Lian não achava que o rapaz seria tão direto em suas ações e ficou chocado. Nan Feng e Fu Yao estavam atônitos também e imediatamente ficaram tensos. No entanto, depois que San Lang bebeu toda a Água Reveladora, o jovem sacudiu novamente  a garrafa e a jogou por cima do ombro, espatifando-a no chão.

“Tem um gosto ruim.”

O choque se apoderou das feições de Fu Yao ao ver que a poção não tivera efeito algum no rapaz. Um momento depois, ele disse impassivelmente, “É apenas água, qual a diferença entre uma e outra?”.

O garoto novamente levou a mão à garrafa ao lado de Xie Lian e respondeu, “É claro que há diferença. Esta aqui tem um gosto muito melhor.”

Xie Lian riu levemente. San Lang realmente não se importava com nenhum desafio lançado a ele, nem ligava para sua verdadeira identidade, então além do entretenimento gerado aos demais, aquela discussão não tinha lógica alguma. O deus achava que aquele assunto seria encerrado por ali, porém Nan Feng se levantou e jogou uma espada sobre a mesa com um barulho alto.

Com uma aura de batalha tão forte ao seu redor, Xie Lian a princípio achou que Nan Feng queria acabar com San Lang ali mesmo e ficou sem palavras por um momento.

“O que está fazendo?”.

“A estrada à frente é perigosa,” o oficial júnior declarou em uma voz baixa. “Este é um presente para o amiguinho aqui, para se defender.”

A bainha da espada tinha um estilo antiquado e possuía arranhões e marcas de centenas de anos. Obviamente, não era uma lâmina comum. Os olhos de Xie Lian se arregalaram ao reconhecê-la, fazendo-o colocar a mão sobre a testa e virar para o outro lado.

Ele murmurou para si mesmo, “É o Espelho Rubro!”.

O nome da espada era realmente “Espelho Rubro”. Aquela era uma arma sagrada. Apesar de não poder combater frente a frente o mal, nenhum ser maligno podia escapar de seu reflexo espiritual. Se alguma entidade não-humana a desembainhasse, a lâmina ficaria vermelha como se estivesse coberta de sangue e refletiria a verdadeira imagem de quem a brandia. Mesmo se fosse um Selvagem ou Supremo, ninguém podia escapar!

Não existia nenhum jovem rapaz que não fosse interessado em espadas ou cavalos, então San Lang parecia bastante animado. “Oh, deixe-me ver!”.

Com a bainha em uma mão e o cabo na outra, San Lang desembainhou a espada. Nan Feng e Fu Yao analisavam tudo com atenção. Contudo, após apenas alguns centímetros da lâmina serem revelados, o jovem riu.

“Gege, seu servos estão brincando comigo?”.

Xie Lian limpou a garganta e virou de volta para eles. “San Lang, eu já disse que eles não são servos.” Depois girou em seu assento novamente.

“Quem está brincando com você?” Nan Feng indagou friamente.

“Como alguém pode se defender com uma espada quebrada?” San Lang embainhou a espada de novo e a jogou sobre a mesa.

A expressão de Nan Feng congelou por um momento, então imediatamente pegou a arma para checá-la. Ele puxou a bainha com força e ouviu algo caindo. Em suas mãos havia agora uma gélida e afiada… lâmina quebrada.

O Espelho Rubro estava destruído sete centímetros abaixo!

O rosto do oficial celeste mudou de cor diversas vezes e ele virou a bainha de cabeça para baixo. O som de metal colidindo ao que os pedaços da espada caíam um por um foi ouvido, depositando vários pequenos fragmentos dela sobre a mesa, brilhantes e afiados.

A espada Espelho Rubro era um poderoso artefato que podia expor seus inimigos, aquilo não era mentira. Mas Nan Feng nunca havia ouvido falar de nenhuma técnica que podia quebrá-la de dentro da bainha!

Ambos os juniores apontaram para San Lang e exclamaram, “VOCÊ—!!!”.

O rapaz riu entredentes e jogou o corpo de volta na cadeira, empurrando-a para trás para colocar os pés sobre a mesa. Ele brincava com um dos pedaços quebrados da lâmina em suas mãos, jogando-o no ar e pegando-o novamente. “Eu tenho certeza de que vocês não fizeram de propósito, só não devem ter sido muito cuidadosos na estrada. Não se preocupem comigo, eu não preciso de uma espada quebrada para me proteger. Podem ficar com ela.”

Já Xie Lian simplesmente não conseguia olhar diretamente para Espelho Rubro. Aquela arma sagrada uma vez pertencera à coleção de Jun Wu, o Imperador Marcial Celeste. Durante sua primeira ascensão, o príncipe uma vez visitou o palácio de Jun Wu e comentou que apesar da falta de força em combate, Espelho Rubro era uma espada deveras interessante, então o Imperador lhe deu de presente. Depois de seu primeiro banimento, houve uma época em que as coisas ficaram bastante difíceis e Xie Lian entregou a espada a Feng Xin para que a penhorasse.

Isso mesmo. Penhorasse!

O dinheiro obtido por penhorar Espelho Rubro foi o suficiente para encher seus estômagos por vários dias. Xie Lian na verdade penhorou diversos de seus tesouros durante aqueles tempos e se forçou a esquecer de cada um deles, para que seu coração não fosse tomado pelo remorso. Feng Xin se lembrou da espada após sua própria ascensão e não podia suportar ver tão precioso artefato sagrado perdido entre os mortais, então a recuperou. Ela foi afiada, limpa e exposta no Palácio de Nan Yang, e agora Nan Feng a havia trazido consigo. Em todo caso, quando Xie Lian colocava os olhos naquela espada, tudo o que sentia era uma dor enfadonha, então tentava não a olhar.

Ele sentiu que os três estavam prestes a começar a discutir novamente e balançou a cabeça, cuidadosamente observando o clima lá fora ao invés disso. O vento estava ficando mais forte, o deus notou. Talvez houvesse uma tempestade de areia mais tarde. Será que eles deveriam continuar? Seriam capazes de encontrar abrigo?

E então, em meio às areias douradas, duas figuras passaram por seus olhos.

Xie Lian endireitou-se imediatamente.

As silhuetas, uma branca, outra preta, caminhavam despreocupadas, porém rapidamente, como se estivessem deslizando entre as nuvens. A figura vestida de preto era esguia e elegante. A de branco, por outro lado, era uma cultivadora, carregando consigo uma espada em suas costas e um fúchén[1] em uma das mãos. Enquanto se afastavam da pousada abandonada, a figura de preto não olhou para trás nenhuma vez, porém a de branco lhe deu uma olhadela e sorriu ligeiramente. Era agourentamente arrepiante.

Foi somente por Xie Lian estar há tanto tempo olhando para fora que pôde ver aquela cena, mas os outros três provavelmente só conseguiram ter visão de suas costas enquanto desapareciam.

Nan Feng instantaneamente parou de discutir e se levantou. “Quem eram aqueles?”.

“Eu não sei, mas não parecem ser pessoas comuns,” o príncipe respondeu e se levantou também. “O vento está aumentando. Parem de brigar e vamos ver até onde conseguimos chegar.”

Apesar do trio constantemente começar pequenas discussões, eles todavia tinham seus corações no lugar certo para cumprir a missão. Então, rapidamente recolheram as peças quebradas de Espelho Rubro e saíram pela porta.

Os quatro continuaram sua caminhada, agora lutando contra os ventos contrários. O grupo andou por outras quatro horas com o silvar do ar em seus ouvidos, mas a distância que conseguiram cobrir era incomparável com a anterior naquele dia. As rajadas de vento ficavam cada vez mais fortes, jogando areia em seus rostos e corpos, grudando em qualquer pedaço exposto de pele. Quanto mais avançavam, mais difícil ficava. Os sopros fortes viraram vendavais ensurdecedores e a areia rodopiava no ar ao seu redor, ofuscando sua visão do caminho.

Xie Lian, segurando seu chapéu de bambu para que não voasse, exclamou, “Esta tempestade de areia não parece normal!”.

Ninguém o respondeu e o príncipe olhou para trás, com medo de que algum deles tivesse se perdido. Porém, todos os três ainda estavam presentes e o seguiam, só que nenhum deles conseguia ouvi-lo. Os vendavais eram tão fortes que sua voz havia desaparecido. Ele não estava particularmente preocupado com Nan Feng e Fu Yao, mesmo com aqueles ventos malucos os dois continuavam a andar estavelmente, cheios de ferocidade. San Lang, por outro lado, caminhava bem próximo a Xie Lian, nunca a mais de cinco passos de distância.

Mesmo com tanta areia soprando e batendo em suas figuras, San Lang permanecia calmo e impassível, seus braços cruzados atrás de si enquanto andava. Sua túnica vermelha e seu cabelo preto dançavam descontroladamente no ar, como se ele não desse a mínima para nada no mundo. Xie Lian podia sentir quão forte a areia batia em seu rosto e estava aflito com como San Lang parecia não ligar para isso. Ele abriu a boca para dizer ao jovem para tomar cuidado com a areia entrando em seus olhos e roupas, mas percebeu que o outro não seria capaz de ouvir nada mesmo, então o deus diretamente se aproximou dele para ajudá-lo a dobrar suas mangas, alisando-as para ter certeza de que o grãos não conseguissem passar por elas. San Lang foi pego de surpresa com o gesto súbito.

Os outros dois vindo atrás se aproximaram e, com todos mais perto e podendo ouvir melhor, Xie Lian tentou dizer novamente. “Tenham cuidado, pessoal. Este vento veio do nada, não parece normal. Talvez haja algo maligno controlando-o.”

“É apenas uma tempestade de areia, quão maligna pode ser?” Fu Yao comentou.

O príncipe balançou a cabeça. “Não há problemas com o vento. Mas pode haver mais que areia nos vendavais, no entanto.”

No mesmo instante, uma poderosa rajada passou por eles, arrancando o chapéu de Xie Lian de sua cabeça. Se voasse para longe, desapareceria no deserto para sempre! Porém, San Lang reagiu imediatamente e o pegou a tempo com um movimento anormalmente veloz. Ele devolveu o chapéu de bambu ao outro mais uma vez e Xie Lian agradeceu.

O deus amarrou melhor o objeto em sua cabeça antes de falar, “Nós provavelmente deveríamos encontrar um abrigo por enquanto.”

Fu Yao discordou, “Se há algo maligno nesta tempestade tentando nos impedir de avançar, então devemos continuar!”.

Antes que Xie Lian pudesse dizer qualquer coisa, San Lang caiu na gargalhada.

Fu Yao levantou a cabeça e indagou friamente, “Do que está rindo?”.

O rapaz cruzou os braços sobre o peito e sorriu. “Ser subversivo te dá a satisfação de se sentir único e independente?”.

Xie Lian sempre pensou que era difícil de discernir se as risadas de San Lang eram sinceras ou não, mas naquele momento definitivamente não havia traço algum de sinceridade em seu sorriso. Os olhos de Fu Yao escureceram e o príncipe levantou as mãos para impedir outro argumento. 

“Podem parar, vocês dois. Se têm contas a acertar, façam isso mais tarde. Não será nada divertido se esta tempestade ficar mais forte.”

“Por quê? Você acha que ela vai te jogar para longe?” Fu Yao zombou.

“Isso pode muito bem aconte—”

Ele não conseguiu terminar a frase antes que os três à sua frente subitamente desaparecessem.

Na verdade, não foram eles que desapareceram, mas o próprio Xie Lian. Outra poderosa rajada de vento havia realmente o levado embora!

Um tornado!

Xie Lian girava loucamente pelos ares. Jogando seus braços para frente, ele gritou, “Ruoye! Segure em algo estável!”.

Ruoye voou de dentro de sua manga e, no momento seguinte, o deus pôde sentir a outra ponta ficar mais pesada, como se houvesse se atado a algo, e o puxou até parar. Depois de finalmente se estabilizar naquela ventania maluca, Xie Lian afinal percebeu que ele havia sido jogado a mais de dez metros do chão! 

O príncipe agora devia parecer uma pipa, preso ao solo apenas por uma única linha. Com a areia batendo freneticamente em seu rosto, Xie Lian segurou-se rapidamente e tentou ver no que Ruoye havia se firmado. Piscando e apertando os olhos, o deus por fim reconheceu a silhueta vermelha. A outra ponta da faixa de seda parecia estar amarrada no pulso daquele jovem vestido de carmesim.

Xie Lian havia comandado que Ruoye segurasse em algo estável e ela se agarrou a San Lang!








[1] [拂尘] no Wudang Wushu ou [佛尘] no Taiji, é uma espécie de espanador comprido sempre relacionado ao taoísmo e às artes marciais, e comumente aparece nas histórias xianxia e wuxia como artefatos de cultivadores. Não há uma tradução específica em português para este objeto, o mais próximo sendo “batedor de rabo de cavalo”, mas a tradutora achou este termo feio e preferiu se ater ao original.



Traduzido por: Mia

Revisado por: Mia

TGCF Brasil



0 Comentários em "Capítulo 20 | Novel 'Benção do Oficial do Céu'"